quarta-feira, abril 29, 2009

Ao fim de mais de três meses em Madrid acho que sou capaz. Capaz de dizer o que penso, o que vejo, o que sinto da cidade.
Uma cidade escavada na serra, com um cheiro que ainda não consigo identificar bem, mas que será qualquer mistura de fritos com pó. Fritos que só os espanhóis são capazes de comer ao pequeno-almoço, recheados com chocolate ou outras especiarias a transbordar de glicose. Pó que entra pelo mais ínfimo buraco das casas, que se acumula atrás das portas e que se esconde por debaixo da cama.
Uma cidade que reúne milhares de pessoas vindas do outro canto do mundo: peruanos, mexicanos, argentinos, colombianos, bolivianos. Imigrantes que trabalham no Burguer King, que exercem as profissões de empregada de limpeza e que limpam as ruas. Imigrantes cujas feições não escondem as suas origens. Olhos rasgados, morenos e pequenos.
Uma cidade que vive uma vida que ainda não tinha experienciado. Uma vida de tapas, imperiais e diversão. Uma vida sempre a sorrir e confiante. De flamenco, reggaeton, salsa, merengue e pouca música estrangeira. De presunto, croquetes, tortilhas, queijo, ovos mexidos, sandes e lombo. (E fritos novamente.)
Uma cidade que caminha de metro por ruas rectas, sem subidas nem descidas. Sem buracos no chão nem calçada. Onde os polícias se vestem de civis, e os civis de policias (em discotecas principalmente).
Uma cidade cara que me deixa sempre sem trocos. Jantares a 20€, almoços a 10€, entradas em discotecas a 15€, bebidas a 10€, passe a 50€, renda da casa a 500€. Uma cidade pequena, limitada pela serra, que facilmente se visita num fim-de-semana (apesar de eu ainda não o ter descoberto na minha agenda).
Uma cidade que não tem barreiras à integração. Que se alegra por conhecer novas pessoas. Uma cidade que recebe sol, chuva e neve. Frio e calor.
Uma cidade que canta o hino à língua espanhola e ao patriotismo. Que estranha a voz real dos actores de cinema e que evita soltar uma palavra estrangeira.
Uma cidade que sobrevive sem violência. Sem facas, tiros ou violações. Que sobrevive de técnicas de roubo silencioso, sem vestigios.
Sim, acho que já sou capaz de dizer o que penso, o que vejo, o que sinto da cidade.

terça-feira, abril 14, 2009

Realeza por uma noite

Há um ano atrás nem queria acreditar que a minha mãe seria a rainha do baile da pinha... depois de muito rirmos punha-se a questão de quem ia fazer parte do reinado... confusões para aqui e para ali.... pessoas que não sabiam dançar... pessoas que não podiam estar presentes... por sorte ou azar vim trabalhar para Madrid, pertinho de Lisboa, e fui "escolhida" para aia... pela minha mãe fiz-lhe esse favor...

Fizémos um vestido (as cores não escolhidas por mim), organizámo-nos em pares, cozinhámos bolos e comprámos bebidas, estivémos no cabeleireiro quatro horas, tirámos fotos e quando as luzes se apagaram entrámos no salão e dançámos a valsa... pronto, o pior já tinha passado... do nosso trono tinhamos a melhor vista sobre o salão... dancei como à muitos anos não dançava...
Um dos pares... eu e o meu primo que sem treinar lá nos desenrascámos

A família real no trono

Eu e a minha pimpolha

sexta-feira, abril 03, 2009

Piso CBR

Vivo com pessoas despreziveis...
Uma usa tudo o que tenho no armário. Dorme na minha cama quando eu não estou. Nascem-lhe montes de borbulhões na cara de vez em quando. Diz "tAparuer" e "Jueves". Só pensa em fazer comida com caril, coisa que não gosto. Recusa-se a lavar a casa de banho. Bebe rum até cair. Só ouve música que faz doer a cabeça. Se digo algo que pode não estar bem põe-se aos berros "Ai filhaaaa". Quer sempre ir à casa de banho quando eu quero. Faz-me fazer figuras perante um chinês fotógrafo. Nunca fica bem nas fotografias. Fuma nem sei o quê. Anda sempre sem dinheiro no telemóvel. Só veste cinzentos e os all stars roxos. Não vê nada sem os óculos mas mesmo assim sai de casa sem eles....
Outro bate-me. Goza comigo. Quer saber tudo sobre a vida pessoal das pessoas. Come tudo o que há em casa sem o consentimento dos outros. Tem nojo de estender as nossas cuecas. Arrota à mesa. Não limpa a casa de banho. Faz almôndegas que parecem bolos brigadeiros. Deixa a luz acesa antes de ir trabalhar. Passa a vida a jogar xadrez no computador. Todas as vezes que faz desporto vem coxo para casa. Bebe um copo e fica logo bêbedo. Parte loiça. Bebe dois litros de leite por dia. Usa sapatos de vela. Chora quando vê os outros chorarem. Vomita entre o metro e a plataforma. Acorda dez minutos antes da hora que é suposto começar a trabalhar. Tem calças até às axilas...
Mesmo assim gosto muito deles!

Re-descoberta

Sinto que voltei a ser eu. As minhas tatuagens lunáticas nunca estiveram tão visíveis, mesmo por baixo da roupa. Deixei de as esconder. As...